Como criar a ação trabalhista perfeita em cinco passos - Parte IV

Publicado em 18/02/2017

Atualizado em 04/05/2018

Categoria: Prática Trabalhista


Como criar a ação trabalhista perfeita em cinco passos - Parte IV


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Passo 4 – Cálculo do valor da ação trabalhista

Existem advogados que mesmo tendo a demanda em seus escritórios, não atuam na área trabalhista por uma única razão: eles não se julgam capazes de realizar os cálculos necessários para entrar com uma reclamação trabalhista.

E então desperdiçam uma ótima oportunidade de aumentar sua carteira de clientes e de processos, pois apenas em 2016, segundo informações do CNJ, 3 milhões de novas ações trabalhistas foram ajuizadas no país, e agora, com toda a insegurança jurídica criada pela Reforma Trabalhista, acredito que este número ainda possa vir a subir no médio prazo.

Alguns acabam entrando com a ação sem realizar o cálculo, o que é certamente muito pior, porque agora, com a entrada em vigência da Lei 13.467/17, não existe mais margem para dúvida:

Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou do ser representante.(grifo nosso). Notificada para indicar o valor correspondente a cada pedido, o reclamante se quedou inerte, conforme certidão de ID 4d36b1e. Impõe-se, desse modo, a extinção prematura do feito, sem resolução do mérito, nos moldes do art. 840, § 3º, da CLT. (TRT-6 - 05/02/2018 - Fonte: Jusbrasil - sem grifos no original)
Conforme requisitos do § 1º do artigo 840 da CLT, intime-se a parte autora para, em 5 dias, emendar a Inicial, com indicação de valor aos pedidos não liquidados, com observância do disposto no artigo 292 do CPC, e, se for o caso, proceder a retificação do valor da causa. Na inércia, ficarão os pedidos ilíquidos extintos sem resolução de mérito (§ 3º do art. 840 da CLT), o que, no presente caso, culminará na extinção do processo sem resolução do mérito. (TRT-15 - 17/11/2017 - Fonte: Jusbrasil - sem grifos no original)

No entanto, vale ressaltar que esta exigência não vale para os processos ajuizados sob o rito ordinário, anteriormente ao dia 11/11/2018, coforme entendimento que majoritário que parece estar se formando na segunda instância de diversas regiões, e que pode ser sintetizado em recente julgado advindo da 4ª Câmara do TRT da 3ª Região:

EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. ART. 485, IV DO CPC INDICAÇÃO DOS VALORES DOS PEDIDOS NA DATA DA PROPOSITURA DA PETIÇÃO INICIAL. LEI 13.467 DE 13/07/2017. EFEITO RETROATIVO. RITO ORDINÁRIO. NULIDADE. É nula a sentença que extingue o processo, sem resolução de mérito, no rito ordinário, em decorrência da falta de indicação dos valores de cada pedido da petição inicial (inépcia), pois na data da propositura da ação trabalhista, anterior à vigência da nova Lei 13.467 de 13.07.2017, este procedimento era desnecessário. (TRT-3 - RO: 00116250220175030107 0011625-02.2017.5.03.0107, Relator: Convocado Eduardo Aurelio P. Ferri, Setima Turma)

De todo modo, agora a realização de um cálculo baseado nos dados objetivos do contrato de trabalho (e não estimado de forma arbitrária) é algo indispensável na ação trabalhista perfeita. Mais que isso, sua falta pode acarretar sérios problemas.

Você pode utilizar o próprio site Valor do Trabalho ou outro software para criar o cálculo do valor da ação, mas, imaginando uma situação perfeita, o ideal seria que você soubesse realizar o cálculo "na mão", e que conhecesse todas as regras que devem ser observadas, para, assim, poder conferir e eventualmente corrigir e/ou complementar os cálculos realizados por softwares.

No caso dos cálculos de liquidação de sentença existe uma gama muito maior de elementos essenciais, como se pode notar do Provimento 04/00/SRC do TRT da 3ª Região, já que a intenção é atender exatamente ao que determinou o comando sentencial.

Esta é a lista de elementos essenciais para realizar a liquidação de sentença trabalhista:

  1. principal;
  2. correção monetária;
  3. os juros de mora;
  4. as contribuições previdenciárias cota reclamante e reclamada;
  5. o imposto de renda ;
  6. o valor atualizado do FGTS a ser depositado em conta vinculada;
  7. as despesas processuais (custas processuais e de execução, honorários periciais, honorários advocatícios, imprensa oficial ou edital de praça, despesas com leiloeiro). ;

No entanto, estamos realizando um cálculo preliminar, que não precisa ter a exatidão de um cálculo de liquidação de sentença, mesmo porque isso é impossível nesta fase processual. Na verdade, inclusive, existem sérios riscos ao se realizar um cálculo típico de liquidação de sentença (como o oferecido pela maioria dos sites de cálculos) na fase inicial do processo. Mas isso é assunto para outra oportunidade.

O que é possível, e relativamente simples, é realizar o cálculo preliminar dos pedidos, pois será apenas quando existir uma sentença da qual não caibam mais recursos, que o cálculo da ação trabalhista poderá ser considerado exato.

Neste sentido, veja o que diz Cristovão Donizetti Heffner em estudo sobre “O valor da causa no processo do trabalho":

A razão para concentrarmo-nos na análise do assunto na fase de conhecimento do processo é simples: nessa fase o valor da causa pode se tornar vulnerável a alterações até que se forme em definitivo, após a liquidação. Pode-se dizer que o valor da causa, iniciando-se de forma subjetiva (pois dependente da análise do mérito), somente atinge sua objetividade (certeza) na fase de execução, quando se transforma no valor da condenação. O valor da causa, portanto, é o valor econômico – estimativo ou não – que o autor da ação dá ao seu pedido. Esse valor, na sentença, se transforma em valor da condenação para fins processuais. Valor da causa e valor da condenação, nessa fase processual – a de conhecimento – como expressão econômica da ação, representa mais um valor referência do que, propriamente, o montante financeiro (certo e determinado) pelo qual o autor da ação sai em busca através da via processual. Ou seja, o resultado financeiro da ação pode ser aquele (inicialmente indicado pelo autor), como pode ser mais, menos, ou nenhum – o que o tornará mensurável é o desenvolvimento do processo, pela resolução do mérito. (Disponível em https://jus.com.br/artigos/13255/o-valor-da-causa-no-processo-do-trabalho - sem grifos no original)

Desta forma, esta é a lista de requisitos essenciais para para calcular o valor da ação trabalhista:

  1. Valor do principal;
  2. Valor dos reflexos entre verbas;
  3. Valor das contribuições previdenciárias cota reclamante;
  4. Valor atualizado do FGTS a ser depositado em conta vinculada;

Na Justiça do Trabalho os juros correm apenas à contar da distribuição da ação, e a correção monetária pela TR é quase inútil quando o assunto é a expressividade econômica de uma ação trabalhista. Também não é necessário apresentar desde já cálculo de IR ou de custas e despesas, e mesmo o cálculo do desconto de INSS cota reclamante não é uma exigência legal, mas que podemos fazer sem problemas.

O principal, então, é a soma de todos os pedidos de pagar quantia certa, e inclui, assim, os reflexos, que basicamente são as integrações do valor de certas verbas na base de cálculo de outras.

Leia também: Como calcular o valor da ação trabalhista após a reforma - Parte I

A única verba que pode mesmo ser considerada um reflexo, a meu ver, data venia, são os reflexos de horas extras nos RSR, os quais dependem de uma operação específica entre estas as verbas. Nos demais casos, trata-se apenas de formar corretamente a base de cálculo de cada verba.

Um dos melhores artigos sobre este importante tema que conheço, de autoria do Juiz do Trabalho Rodrigo Ribeiro Bueno é este: Reflexos, repercussões, incidências e integrações nas parcelas trabalhistas pleiteadas na petição inicial e deferidas na sentença, e recomendo fortemente sua atenta leitura, além de sua utilização como uma confiável fonte de pesquisa.

Antes de continuarmos, vale reforçar que a necessidade de incluir o cálculo dos reflexos não é unânime na doutrina e jurisprudência. A este respeito, veja o que diz o magistrado Rodrigo Ribeiro Bueno:

“Vale lembrar que a questão dos reflexos não está relacionada com fazer, propriamente, os cálculos das parcelas trabalhistas pedidas ou deferidas, mas de se pedir ou deferir os reflexos para que, finalmente, os cálculos aconteçam com regularidade na fase de execução de sentença.” (citado acima)

Seria inviável falar nesta oportunidade sobre todos os tipos possíveis de cálculos trabalhistas (em geral simples operações aritiméticas), mas existem duas coisas que são muito importantes para todos eles.

Diferença entre salário e remuneração

A primeira é entender a diferença entre o salário e a remuneração. Algumas vezes a legislação fala em salário, e em outras, em remuneração.

Veja abaixo a didática definição de Felipe Cavalcante, no artigo Reforma trabalhista: salário e remuneração:

Nesse aspecto temos que salário é a contraprestação devida ao empregado pela prestação de serviços decorrentes da relação de emprego. Já a remuneração é a soma do salário contratual com outras vantagens percebidas na vigência da relação do contrato de trabalho, tais como adicionais (noturno, periculosidade, insalubridade, HE), comissões, porcentagens, gratificações, diárias e outros, podendo, inclusive, terceiro pagar determinadas parcelas, tais como gorjetas e gueltas (art. 457 da clt). (Reforma trabalhista: salário e remuneração, Felipe Cavalcante - sem destaques no original)

Diferença verba salarial e verba indenizatória

Após a entrada em vigência da Lei 13.467/17, diversas verbas que anteriormente possuíam natureza salarial passaram a possuir natureza indenizatória.

Ainda é impossível dizer se tais modificações serão consideradas inconstitucionais pelos Tribunais pátrios, porém, levando em consideração a nova redação dos art. 457 e 458 da CLT, é possível identificar que ao menos 8 verbas passaram a ter natureza indenizatória (deixando de integrar bases de cálculo diversas e de incidir em INSS).

Confira abaixo a lista elaborada pelo advogado Felipe Cavalcante, no mesmo artigo citado anteriormente:

Desse modo, observamos que, conforme a reforma trabalhista, e em combinação com as regras mantidas na CLT, não possuem natureza salarial: I. Gorjetas (possui natureza remuneratória, e não salarial); II. Participação nos Lucros e Resultados (PLR); III. Ajuda de Custo; IV. Auxílio-Alimentação (vedado o pagamento em dinheiro); V. Diárias para Viagem (independentemente do percentual pago); VI. Prêmios; VII. Abonos; VIII. Abono de Férias (só terá natureza de salário se o abono de férias ultrapassar ao montante correspondente a 20 dias do salário do empregado). (Reforma trabalhista: salário e remuneração, Felipe Cavalcante - sem grifos no original)

A terceira parte do artigo Como calcular o valor da ação trabalhista após a reforma - Parte I irá tratar mais profundamente desse assunto, mas, apenas para que este artigo não fique desatualizado, vale incluir aqui a Tabela das Verbas Salariais e Indenizatórias Antes e Após a Reforma, que irá compor a terceira parte do artigo citado.

A tabela abaixo aponta quais direitos trabalhistas que possuem natureza salarial, e quais possuem natureza indenizatória, antes e após a Lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista):

Tabela das verbas salariais e indenizatórias após a Reforma Trabalhista

Verba Pré-reforma Pós-reforma Mudou
Abonos salarial indenizatória sim
Ajuda alimentação salarial indenizatória sim
Ajuda de custo salarial indenizatória sim
Bonificações habituais salarial indenizatória sim
Diárias para viagens que excedam 50% do salário salarial indenizatória sim
Gorjetas * salarial indenizatória sim
Participação nos lucros habitual salarial indenizatória sim
Prêmios habituais salarial indenizatória sim
Percentagens salarial indenizatória sim
Percentual sobre os lucros ajustado contratualmente salarial indenizatória sim
Abono de férias (sem exceder 20 dias de salário) indenizatória indenizatória não
Adicional de função salarial salarial não
Adicional de insalubridade salarial salarial não
Adicional de penosidade, art. 7º, XXIII, CF salarial salarial não
Adicional de periculosidade salarial salarial não
Adicional de transferência salarial salarial não
Adicional noturno salarial salarial não
Adicional por tempo de serviço salarial salarial não
Ajuda alimentação – quando prevista em Convenção Coletiva indenizatória indenizatória não
Aviso prévio indenizatória indenizatória não
Bolsa aprendizagem a adolescente até 14 anos indenizatória indenizatória não
Bolsa estagiário indenizatória indenizatória não
Bonificações eventuais indenizatória indenizatória não
Cobertura médica e odontológica (sob condições) indenizatória indenizatória não
Comissões salarial salarial não
Complementação do auxílio doença (sob condições) indenizatória indenizatória não
Despesas de viagem (são sujeitas a comprovação) indenizatória indenizatória não
Diárias que não excedam a 50% do salário indenizatória indenizatória não
Férias indenizadas indenizatória indenizatória não
Férias – quando gozadas salarial salarial não
FGTS indenizatória indenizatória não
Gratificações salarial salarial não
Habitação, energia elétrica e veículo indispensáveis indenizatória indenizatória não
Horas extras salarial salarial não
Indenização de seguro desemprego indenizatória indenizatória não
Licença prêmio indenizada indenizatória indenizatória não
Vestuários, equipamentos e outros acessórios (sob condições) indenizatória indenizatória não
Cessão de direitos autorais indenizatória indenizatória não
Participação nos lucros eventual indenizatória indenizatória não
Prêmios eventuais indenizatória indenizatória não
Quebra de caixa salarial salarial não
Reembolso de creche (sob condições) indenizatória indenizatória não
Salário Família salarial salarial não
Vale alimentação indenizatória indenizatória não
Vale transporte indenizatória indenizatória não
Plano educacional indenizatória indenizatória não
Danos morais indenizatória indenizatória não

O mais importante desta parte do artigo é deixar bem clara a necessidade de apresentar um cálculo de todas as verbas que estão sendo pleiteadas para pagar quantia certa, e que este cálculo não precisa ser perfeito, mas precisa observar os dados fáticos do contrato.

Para saber mais sobre como calcular o valor da ação trabalhista leia também o artigo Como calcular o valor da ação trabalhista após a reforma - Parte I, e conheça o Gerador de Cálculos Preliminares do site Valor do Trabalho, único programa que considero atualmente adequado para o realizar o cálculo do valor da ação trabalhista, atualizado de acordo com a Lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista).

Fim da Parte IV

Continue lendo a Parte Final

Gustavo Borceda, advogado e criador do site Valor do Trabalho

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